Voltar ao site

Judiciário gaúcho se apoia em subnotificação de casos de COVID-19 para negar pedidos de liberdade a presos de grupos de risco

Infovírus

· Extras

O grupo de Poder, Controle e Dano Social da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) analisou 478 decisões tomadas em junho de 2020 pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ/RS) em pedidos de liberdade ou de prisão domiciliar a pessoas presas, solicitados durante a pandemia de COVID-19. A pesquisa constatou que 92,25% dos pedidos foram decididos em prejuízo do réu.

Das 478 decisões, 417 se tratavam de pedidos formulados pelas defesas dos réus, das quais 96,6% (403) foram denegatórias.
O Ministério Público (MP) foi autor de 61 pedidos de revogação da liberdade provisória ou prisão domiciliar. Destes, 62,2% (38) foram concedidos, 36% (22) denegados e um não foi conhecido. O MP também é responsável por pleitear, caso a caso, a adoção da Recomendação nº 62 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). No entanto, a maioria absoluta das intervenções do MP nas decisões analisadas foram em prejuízo do réu, o que contraria a medida do CNJ.
A alegação mais frequente do MP foi o perigo abstrato representado pela soltura dos réus. Por outro lado, em nenhuma das decisões analisadas, o MP reconheceu o perigo concreto gerado pela manutenção do encarceramento no contexto da crise da COVID-19, sobretudo às pessoas integrantes do grupo de risco.
Já os argumentos mais utilizados pelos desembargadores para denegar os pedidos foram a suficiência das medidas preventivas adotadas pela administração, as boas condições das unidades prisionais e a não existência de nenhum detento infectado pelo novo coronavírus até aquele momento.

Em junho, mês em que foram julgadas as decisões, aumentaram consideravelmente os casos notificados de COVID-19 nas prisões gaúchas, como o Infovírus mostrou. Em nenhum momento as decisões mencionam o número de testes realizados entre detentos e servidores. Elas alegavam não haver casos, sem considerar a subnotificação por falta de testes, aliada às condições higiênicas precárias e à superlotação do sistema carcerário gaúcho.

De 24 de março a 5 de maio, o Núcleo do Pampa de Criminologia analisou 231 ementas de habeas corpus do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS) e verificou que 80,95% (187) foram denegados. Em maio, o grupo Poder, Controle e Dano Social verificou 486 decisões do TJ/RS em pedidos de liberdade ou de prisão domiciliar durante a pandemia e constatou que 92% dos pedidos foram negados pelos desembargadores.
Em junho, apesar do aumento nos casos de contaminação de detentos pela COVID-19, o padrão decisório do TJ/RS seguiu o mesmo. As decisões parecem não acompanhar a situação sanitária do país e a realidade material das prisões e negam pedidos sob os mesmos fundamentos e fontes que já se provaram inverídicas ou simplórias.