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Pandemia e sistema prisional, pelo olhar das mães

Leiza

18 de dezembro de 2020

Eu, Leiza, mãe de interna do sistema prisional, gostaria de relatar algumas coisas que aconteceram desde que se iniciou a pandemia em março desde ano (2020).

Em março, as visitas no presídio foram suspensas. Na época, não era possível ter nenhuma notícia das internas, não era possível cartas, Sedex e entrega das bolsas foram suspensas também.


Foi um momento angustiante, pois não recebíamos nem podíamos enviar notícias.

Em abril foi liberado para que fizessemos a entrega das bolsas, no dia dessa entrega era possível levar as bolsas com comida, alimentos, higiene, sucata e também era possível enviar as cartas e receber cartas.


Em um desses dias em que levei as bolsas com alimentos vi que os guardas descartaram muitas coisas. Isso me deu bastante revolta e também tristeza, pois trabalho muito para comprar comida e ajudar minha filha nesse período difícil. E ver os alimentos sendo desperdiçado foi um absurdo.


Como foi liberado a minha filha e, as internas em geral, enviar bilhetes para os familiares, recebia muitos deles relatando as dificuldades que elas enfrentavam lá dentro. Nas cartas elas constantemente relatavam que a comida servida no presídio estava azeda e que as meninas estavam sem medicações e remédios.

Em uma das cartas recebidas uma das meninas me pediu desesperadamente para que eu comprasse a medicação de bronquite dela. Os guardas, inicialmente, não deixaram que eu enviasse a medicação, e informaram que teria que ser o próprio familiar para entregar, mas eu insisti sabendo a necessidade que o remédio tem para uma pessoa com bronquite. Após a minha insistência os guardas cederam e fui rapidamente na rua comprar a medicação.


Uma vez, eu consegui doações de medicamentos, que incluíam pomadas ginecológicas, antibióticos, entre outros remédios que seriam importantes para as necessidades das internas, mas a doação não foi aceita por parte do presídio/guardas.

Nesse período, os bilhetes vinham com muitos pedidos de ajuda, em um deles outra jovem pediu que eu procurasse e entrasse em contato com a mãe dela, pois não tinha notícias da mãe por cartas ou recados e estava muito preocupada.
As internas reclamavam bastante também dos abusos e agressões sofridas pelas guardas, que se reportaram a elas com palavras de baixas calão.


A minha filha relata muito a discriminação sofrida pelas internas pretas, sendo o tratamento que estas recebem bem pior que as outras internas. Certa vez, em uma visita, ela me contou aos prantos que as internas pretas eram chamadas de pretas sujas, macacas e imundas dentro do presídio. Sendo o racismo lá dentro cruel e escancarado.


Quanto a visita retornou percebi que as internas estavam visualmente bem mais magras.


Os horários para as visitas também não tem sido respeitado, o horário determinado para vê-las é de 09h - 12h, mas muitas vezes só permitem quem entremos por volta de 11h.